quarta-feira, 20 de abril de 2016

A adivinha

"Com um beijo só, cobres o rosto do mundo, onde espreitam os tímidos e se escondem os corajosos, porque o amor é como um rasgo de sol num cenário cadavérico, nunca se sabe quando vai (re)aparecer."

A noite é gelada. A lua é arrepiante. A imagem impressiona. Eu fujo, eu escondo-me, eu sento-me atrás de ti sem sequer me veres. Não há pinheiros, não há rochas, há pinhões e pedras. Camisas desfraldadas em calças sem bolsos, e bolsos sem mãos e mãos sem dedos...
"Que perfeição!" Que enlevo de monte. Adora e pasma o mundo, que não o vê, porque na realidade não está lá (o mundo, não o monte), não há nada. Nem luz, nem cores, nem lembranças...Mas eu, essa mão que abre os olhos, esse alguém que abre os braços aos dias do meu leito, quando os dias não aparecem, estou cá. Alma frouxa de prantos mortuários, vítima de um sonho inanimado pronto a ganhar vida, para esculpir as faces com cuspo, num gesto compulsivo, e agarrar as águas que me escapam por entre os dedos à medida que vão nascendo nos meus olhos. O que tenho? O que penso? O que desejo?
São quimeras de sentimentos, nascendo numa terra dura sem sequer lá terem sido semeadas e não é preciso ser-se um génio para divinhar.

 07/03/1998, CR (CM)

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