quarta-feira, 9 de maio de 2018

Ínvio

Perdida de amores, era com extrema atenção que tentava apagar com o que tinha à mão, a tinta que lhe manchava as pernas magras, pouco definidas, mas graciosas. Nesses detalhes que as calças de ganga desbotadas, mal escondia. Mas, sem se importar realmente com a aparência, oferecia seus lábios,  para um beijo vendido, mas não comprado, seduzido pelas sensações que combinavam o doce de um limão, com a amargura de um morango, num antagonismo de sabores que o tornavam demorado. 
Às vezes, durante o despertar das tardes e o adormecer das manhãs, lá lhe aparecia o sussurro do coração, e por momentos, ouvindo os seus mexericos, deixava-se levar por esse caminho ínvio, sem arrepiar caminho. Tudo o que sabia é que se olhasse nos seus olhos sem desviar o olhar talvez o feitiço se quebrasse. Mas seria feitiço? Quem sabe se seria. Quem sabe o que seria.
Demasiado ruído para se entender, ou emotivo para explicar, mas quando o silêncio aparecia, lá vinha o beijo e foram tantos, vagarosos, irresistíveis... os miseráveis! Tão perturbadores que, por mais que tentasse, não conseguia sequer lembrar-se deles, apenas sentir-lhes o gosto... se a um quase também for permitido sentir.

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