Boa Fortuna tem 3 filhos que correm descalços pelo asfalto para verem o pai chegar, depois de mais um dia de trabalho.
Sua esposa, a Cremilde dos Dias Melhores, morreu de uma doença estranha, algures entre a Malária e a Sida. Seus filhos, com nomes normais, Pedro de 14 anos, o João de 8 e o Manuel de 5, vivem entre a caridade da associação do bairro e os trabalhos precários e pouco incertos que o pai lá vai arranjando. Felizmente que Deus não lhe deu meninas, porque as raparigas são sempre uma fonte de problemas.
Boa fortuna nunca foi à escola, nunca viu o mar, nunca saiu do bairro.
No ano passado recebeu a visita de uns senhores engravatados com umas bandeirinhas coloridas, vieram discursar sobre um milagre “Rendimento mínimo qualquer coisa”. Boa Fortuna não percebeu nada, não é instruído, cresceu demasiado depressa para isso. O Presidente do Bairro disse-lhe que ia receber dinheiro e incentivou-o a assinar uns papéis, mas passaram-se meses e nada.
O Presidente mudou de casa, de carro e foi-se embora.
Que pena, era tão boa pessoa!
O Presidente mudou de casa, de carro e foi-se embora.
Que pena, era tão boa pessoa!
Boa Fortuna passa fome. Todos os dias por volta das 23h00, aguarda à porta das traseiras de um restaurante da cidade, ao lado do seu bairro. Fica à espera que lhe dêem os restos de comida e eles dão. Para ele, é a primeira e única refeição do dia.
Com os sacos cheios de comida boa, regressa a casa. Os filhos estão à sua espera a dormir, algures entre as ratazanas, as baratas e outros bichos de estimação pouco visíveis a olho nu.
Boa Fortuna está cansado; por vezes apetece-lhe desistir destes dias longos e duros, acabar com a má sorte que a vida lhe deu... mas quando regressa finalmente a casa e os seus meninos o abraçam cheios de ternura e felicidade, tudo desaparece: a tristeza, o cansaço, a vontade de desistir…
Com três crianças tão belas, Boa Fortuna, só poderia ser um homem afortunado.
Imagem: Internet
3 comentários:
Muito bonito o texto, mas sobre uma realidade tão triste...kiss
Um filho é o que nos dá alento nos momentos mais difíceis. Não tenhas dúvida. Também já quis baixar os braços. Um dia, em que o meus braços já estavam mais abaixo que a meio um pequeno ser de 4 anos pegou na sua fraldinha de pano e, limpando-me as lágrimas, disse:
"Mamã, não chores. O papá não está aqui, mas eu estou."
Frase dita a tropeçar nas palavras que tentavam escapulir por entre uma chucha... frase dita por uma criança de apenas 4 anos com a força de 3 leões... frase dita pela minha filha que, desde esse dia e até aos dias de hoje é o meu pilar de aço e betão. Ela é a minha força... e sabe disso!
Obrigada Caty pelo que escreveste. Obrigada por me fazeres regressar ao passado, sem mágoa...!
Beijinhos**
A realidade é a realidade Tulipa, umas vezes é triste outras vezes é alegre, assim é a vida, o truque está em viver cada dia o melhor que se puder.
É verdade Lala, por vezes é preciso ir buscar forças a quem está perto de nós.
Bjs Catarina
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